Varão diz:
-Perdido, nas profundezas deste espelho
Vejo a vida passar como um filme antigo,
Embaçado por um líquido vermelho
E a ser estrelado por um velho amigo.
-Invoco, então, as almas de entes perdidos,
Que o mau presente não me deixa ver mais.
E o passado de sentimentos feridos
Dá-me, agora, bela imagem de meus pais.
-Preso na efemeridade do terreno
Sinto a vida como um enorme presídio.
D’onde alguns fogem pelo vinho-veneno
Sem temer a vontade d’um suicídio.
-Oh, Efêmeras Lagartas Corajosas,
Que se enclausuram para poder viver,
Qual o porquê de se ter asas tão mimosas
Já que o Senhor Tempo trata de as comer?
-Vamos, amigo Espelho! Mostre-me mais!
Mostre-me o que mais de mim ficou pra trás!
-Mostre-me, agora, os meus sonhos de criança,
Para eu poder sair deste espelho em paz.
Mostre-me o quanto da vida é esperança
E quanta falta não tê-la em mim me faz!"
Trovador diz:
E pela noite, ao sair p'ra boemia,
Leva consigo su'alma burocrata.
Espalhando confusão e epidemias,
Ilustrado ao belo som de uma sonata.
Uma sonata tocada bem feliz.
Tão feliz que a Terra inteira, toda, brilha!
Uma sonata que com escalas diz:
"Uma galante canção para a Matilha!".
E já ao deixar o espelho de fundo eterno
E ter visto a vida como um filme antigo,
Vai deitar-se feliz, com prazer interno,
O vil varão por ter visto o velho amigo...
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